1.
Antes de mais nada, é importante ressaltar que no Aikido não existe
competições (conflito de egos), já que todos se unem em busca de um espírito
forte, crescimento interno e aproximação com a natureza e seus princípios.
2.
Apoia-se sob o princípio da suavidade, que ensina que devemos sempre
aproveitar a força do oponente e redirecioná-la, nunca ir contra ela.
3.
Através de um treinamento persistente e disciplinado, o praticante aprende a
usar a força do adversário e conduzi-la para onde quiser.
4.
Existem momentos corretos de se investir contra o adversário. Esses momentos
são aprendidos no KOKYU (momento certo). O KOKYU é fundamental para que o
praticante aprenda a encaixar suas técnicas sem fazer o uso de força.
5. A
percepção do ritmo do adversário e a busca do aperfeiçoamento do KOKYU são
muito importantes, bem como a utilização da energia “KI”, inerente a todo ser
humano.
6. No
treinamento do Aikido, os praticantes revezam-se, alternando papéis de
atacante e defensor. As técnicas são executadas de maneira calma e
confortável, porém de maneira sincera. Treina-se sempre com parceiros
diferentes. Não há problema quando treinam juntos homens e mulheres, gordos e
magros, idosos e jovens.
7. Com
esse tipo de treinamento, aprende-se a lidar com qualquer tipo de oponente ou
adversidade, encaixando melhor as técnicas de acordo com cada indivíduo ou
situação.
8. Três
fundamentos do treino : colaboração (ajudar e ser ajudado pelos parceiros na
busca do aperfeiçoamento), conforto (técnicas aplicadas de maneira prudente)
e cortesia (pensar nos outros).
9. As
técnicas são caracterizadas por movimentos esféricos, livres e espontâneos.
Os movimentos de corpo baseiam-se em giros e esquivas. Chaves de pulso, contra
ataques (atemi), projeções e imobilizações, dentre outras, também são
técnicas usadas pelo Aikido.
10. O
principal objetivo da arte marcial é nos desenvolvermos como pessoas e não
satisfazer o nosso ego nem destruir ou causar danos ao oponente.
11. O
Aikido é uma Arte Marcial extremamente eficiente, porém também se torna muito
útil quando aplicada nas mais diversas situações de conflito em nossa vida
diária.
Regras de etiqueta e comportamento no Dai Shizen Dojo 1. É responsabilidade de todos manter as regras tradicionais de conduta no Dojo. Este espírito vem do Fundador e deve ser respeitado, honrado e mantido. 2.Todos temos responsabilidade em criar uma atmosfera positiva de harmonia e respeito. Assim, devemos evitar que nossas atitudes ofendam os outros. Por exemplo, se alguém por convicções religiosas não quer reverenciar o kamizá, pode pedir para que entre após o cumprimento ter sido feito e saia antes do cumprimento final. Ou mesmo, pode pedir que seja desobrigado desta reverência, por exemplo; 3. O Dojo não deve ser utilizado para outro fim a que se destina, salvo expressa autorização do sensei; 4. A limpeza é uma oração de agradecimento, é dever de todos executar a limpeza física (antes e depois do treino) e do coração de todos. Isto é SHUGYO (purificação do espírito) e ensina disciplina; 5. É decisão do Sensei quando ele deve ensinar alguma técnica. Não se pode comprar técnicas. A mensalidade (OREI) é uma pequena parcela para ajudar a pagar as despesas para o local de treinamento e é uma forma muito pequena de demonstrar a gratidão do aluno ao mestre por seus ensinamentos; 6. Respeitar, Respeitar, Respeitar, é um pensamento contínuo no Dojo. 7. É um dever moral de todos usar as técnicas para fins pacíficos visando sempre construir. Você deve exercitar sua percepção ao tentar enxergar a aplicação (tanto de defesa pessoal como de relacionamento) presente em cada princípio/técnica demonstrados; 8. Não deve haver conflitos do ego no tatame. Aikidô não é um ringue de competição de vaidade. Não pode haver algo do tipo: “eu consigo fazer a técnica em você, mas duvido que você a execute em mim”; 9. A insolência jamais será tolerada, devemos ter consciência de nossas limitações. Quando o professor corrigir sua técnica, permaneça em seiza e ao término da instrução diga: DOMO ARIGATO! 10. Cada pessoa tem condições e razões diferentes para treinar. Devemos respeitar suas expectativas. 11. Não é educado contra argumentar com o sensei. Mas o assunto pode ser discutido se ele assim permitir. Se o argumento/instrução dele lhe convencer, agradeça (DOMO ARIGATO) e volte a treinar. Se for admoestado, peça desculpas: GOMEN NASAI! E volte a treinar; 12. A não ser que suas convicções religiosas o impeçam, faça a reverência ao Kamizá ao entrar e sair do Dojo. 13. Respeite seu uniforme de treinamento, deve estar sempre em boas condições e de aparência. 14. O Dojo não é uma praia, sente-se sempre em seiza ou com as pernas cruzadas no estilo japonês ( posição de lótus), no caso de ter problemas no joelho. 15. Quando o Sensei demonstra uma técnica, fique sempre em Seiza, após, faça uma reverência, agradeça (DOMO ARIGATO, SENSEI) e comece imediatamente a praticar. 16. No início de cada técnica, cumprimente seu parceiro(ONEGAI SHIMASS) 17. Quando o final de uma técnica é assinalada, cumprimente o parceiro (DOMO ARIGATO)e vá imediatamente para seu lugar de início da aula. 18. Se for absolutamente necessário perguntar algo ao Sensei, vá até ele, não o chame para si. Se o problema for a execução de uma técnica, tente primeiro observar os outros. Se mesmo assim não conseguir, primeiro mostre como você entendeu a técnica. Depois ele o auxiliará. 19. Respeite os sempai, jamais discuta se as técnicas estão erradas ou não. Lembre-se que você está treinando para aprender, não para satisfazer o seu ego. Adote uma postura receptiva e humilde, porém não bajuladora. 20. Se você não é Yudansha, não corrija ninguém. 21. Não converse em cima do tatame. Aikidô é experiência. 22. Não se deve usar jóias, mascar coisas no tatame. Além do corpo somente se usa o uniforme 23. Se você chegou atrasado, vista-se rapidamente, vá para o inicio do tatame e - na posição de seiza - aguarde até o sensei permitir que você entre no tatame. Cumprimente-o com ONEGAI SHIMASS 24. Não seja atingido. Não permita ser socado, chutado, agarrado, derrubado ou posto no chão. Aikido é controle do inicio ao fim. Quando você permite que lhe toquem (qualquer que seja a forma) está perdendo parte desse controle. Mas não exagere nos golpes e movimentos para não ferir os colegas de treino. Ninguém entra numa aula de aikido para servir de "saco de pancadas" de alguém. 25. O treino mais vigoroso é reservado aos graduados. Tenha paciência. Aguarde. O seu dia chegará. 26. Se comparecer a uma aula/demonstração/seminário com um professor diferente, lembre-se de seguir a forma que está sendo demonstrada no seminário e não a que você aprendeu em seu dojo original. A capacidade de se adaptar também faz parte do aikido. 27. Ao se matricular no Aikido, você deve possuir obrigatoriamente um Dogi (Kimono) branco simples, adquirido em qualquer loja de esportes ou na Loja Kimonos Dojo* - www.kimonosdojo.com.br - na Casa Verde - Zona Norte. Recomendo esta loja por ter um preço baixo e um ótimo atendimento e qualidade. *Rua Francisco Marinho, 232 - Casa Verde - São Paulo - SP Fones 3965-1552 e 3858-6725
Lembre-se: Se você não concordar com essas regras, não estará apto a treinar conosco.
Entrevista com o Sensei Emerson dada a um Jornal de São Paulo:
Quando a opção
modifica o comportamento:
"Modalidade de
arte marcial se diferencia das demais por oferecer filosofia de vida"
"O professor é
dotado de serenidade tal que - apesar de seu tamanho e feições típicas do
ocidente - tem-se a impressão de estar na presença de um pequeno um senhor de traços
orientais. Os alunos, de frente para ele, ficam no lado oposto da sala. Todos em posição seiza. Um deles é convidado a se aproximar de seu sensei (mestre). Sem se levantar, o aprendiz rasteja pelo
tatame, em um movimento alternado de pés e joelhos. Palavras de aprovação são
proferidas. O aluno é parabenizado por sua mudança de faixa (Kyu); uma
conquista que vem da superação não do outro pela força , mas de si mesmo pela
técnica. A conquista é tomar o oponente por parceiro, a derrota dos inimigos
internos e o aprendizado de uma filosofia de vida por meio do corpo.
Uma aula que
começa no Brasil e termina no Japão. A
todo momento, os valores de respeito e disciplina, hoje estranhos a cultura
ocidental, são reforçados pelo sensei Emerson Zacarella, praticante de Aikido
há quase 20 anos: “Muitas das artes marciais que vieram para nosso país perderam a
característica da disciplina para se adaptar ao gosto do brasileiro, que adora
informalidade. Aqui não. A primeira coisa que eu respeito é a disciplina, tanto
é que nós ainda somo ligados ao Japão”. Membro da Federação Brasileira de
Aikido ( FEBRAI) desde 2002, ele diz que certos cuidados como reverências,
rituais e pontualidade de uma arte oficializada em 1948 - inspirada em modalidades
como o Daito Ryu Aikijujutsu- são mais uma forma de aprendizado da paciência e
humildade. “ Hoje a gente vive em uma sociedade de resultados rápidos. Além
disso, as pessoas não gostam de se submeter, de reverenciar. A pessoa não está
se submetendo. Ela está apenas agradecendo o local de treino e uma pessoa que te
indicou um caminho” - fala Emerson referindo-se ao fundador do Aikido, Morihei Ueshiba.
Diferente das
lutas e demais artes marciais, o Aikido é uma prática que tem por finalidade a
doutrinação da mente pelo físico: “O corpo ensina a mente”, explica Emerson. A
repetição constante dos exercícios e a ausência de noções de vitória e derrota
contribuem para o aprendizado que prima pelo equilíbrio. Outro ponto marcante é
a questão da força: “Ao meu ver, no Aikido não é necessária a força física,
muito pelo contrário: quanto mais força pior é a técnica. E a técnica desta
arte é fluída, onde, por meio de movimentos
circulares, o praticante absorve e devolve para o parceiro a energia que nele
foi projetada”, e exemplifica “ quando uma pessoa me pega, ela , de alguma
maneira, tem a intenção de me conduzir para alguma direção. Eu não preciso
brigar, eu vejo a direção para onde ela quer me conduzir e vou, mas da minha
maneira. Daí eu consigo imobilizá-la. Parece meio contraditório porque a gente
fala em luta e não tem força. Mas o fundador desta arte marcial, percebeu que é
melhor se harmonizar com a situação e chegar junto a um consenso. A técnica é
mais ou menos assim”, diz o professor.
A filosofia da
prática no local de treino se transporta para o cotidiano do aprendiz, que
aprende a lidar com situações de medo, preocupação e estresse. “ A gente tem
idéia de que este tipo de atividade é para destruir. No Aikido não se destrói
nada, você se une ao seu parceiro. E isso acaba refletindo na sua vida onde
você passa a não querer mais competir com os demais”diz o sensei. Ele mesmo
confessa ter tido muita dificuldade no começo do treinamento, mas que hoje se
tornou mais centrado: “ O Aikido muda muita coisa, principalmente na
personalidade. Eu me tornei uma pessoa muito mais paciente, mais calma. Eu vejo
o pessoal treinando e ninguém teve mais dificuldade no começo que eu. Eu tive
muita dificuldade. Talvez tenha sido por isso que eu persisti”, ele ri."
Entrevista á Milena Sartorelli.
Morihei Ueshiba, o fundador do Aikido, certa vez disse a um grupo de alunos veteranos: “Venham ao dojô amanhã de manhã, às cinco horas; vou revelar-lhes os segredos do Aikido”. No dia seguinte, os alunos chegaram na hora marcada, esperando ansiosamente a revelação de um segredo que os tornaria invencíveis como o mestre – então eles seriam capazes de enfrentar dez oponentes ao mesmo tempo e de imobilizar o adversário mais forte com um único dedo. Morihei pediu aos alunos que se sentassem e começou a expor os segredos do Aikido. Empregando um simbolismo vibrante, alegorias encantadoras e associações estimulantes, por mais de uma hora Morihei discorreu sobre temas como a criação do Universo, o poder vivificante dos sons-espíritos, a alquimia sutil do fogo e da água, a necessidade de serenar o espírito e retornar à Fonte, a natureza transformadora da mente e a unificação do corpo, e sobre outros mistérios que faziam parte da sua experiência pessoal. Inesperadamente, ele sorriu com suavidade e concluiu: “Esses são os segredos do Aikido”. Fez então uma profunda reverência diante do altar do dojô, saudou os presentes e se retirou rapidamente da sala. Os alunos ficaram desnorteados com as palavras do mestre. Os que tinham a expectativa de aprender alguma proeza extraordinária ou de receber as palavras de uma fórmula mágica estavam ressentidos: “Ele não nos mostrou nada – nem uma única técnica, e nada de concreto que se possa usar!”. A intenção de Morihei fora a de revelar o Aikido como uma epifania profunda e maravilhosa, e não como um mero sistema de empurrões, de bloqueios e imobilizações. Morihei quis dizer que, se o praticante não aprender a essência do Aikido, as técnicas jamais se transformarão em vida. Texto do livro “Os Segredos do Aikido” de John Stevens
Uma Resposta Branda: O Aikido na Prática
Por Terry Dobson* “O trem atravessava
sacolejando os subúrbios de Tóquio numa tarde de primavera. Nosso vagão estava
comparativamente vazio: apenas algumas donas de casa com seus filhos e uns
velhos indo fazer compras. Eu olhava distraído pela janela a monotonia das
casas sempre iguais e das sebes cobertas de poeira.
Chegando a uma
estação, as portas se abriram e, de repente, a quietude da tarde foi rompida
por um homem que entrou cambaleando no nosso vagão, gritando com violência
imprecações incompreensíveis. Era um homem forte, encorpado, com roupas de
operário. Estava bêbado e imundo. Aos berros, esbofeteou uma mulher que
carregava um bebezinho. A força do tapa fez com que ela fosse cair no colo de
um casal idoso. Só por um milagre nada aconteceu ao bebê. Aterrorizado, o casal
deu um pulo e fugiu correndo para
a outra extremidade do vagão. O operário tentou ainda dar um pontapé na velha,
mas errou a mira e ela conseguiu escapar. Isso o deixou em tal estado de fúria
que agarrou a haste de metal no meio do vagão e tentou arrancá-la do balaústre.
Pude ver que uma das suas mãos estava ferida e sangrava. O trem seguiu em
frente, com os passageiros paralisados de medo. Eu me levantei.
Na época, cerca de
vinte anos atrás, eu era jovem e estava em excelente forma física. Vinha
treinando oito horas de Aikidô quase todos os dias há quase três anos. Gostava
de lutar corpo a corpo e me considerava bom de briga. O problema é que minhas habilidades
marciais nunca haviam sido testadas em um combate de verdade. Nós, alunos de
Aikido somos proibidos de lutar.
"Aikido", -
meu mestre não cansava de repetir, "é a arte da reconciliação. Aquele cuja
mente deseja brigar perdeu o elo com o Universo. Se tentarem dominar as
pessoas, estarão derrotados de antemão. Nós estudamos como resolver conflitos,
não como iniciá-los."
Eu ouvia essas
palavras e me esforçava. Chegava a atravessar a rua para evitar os arruaceiros,
os pungas dos videogames que costumam vadiar perto das estações de trem. Ficava
exaltado com minha própria tolerância e me considerava um valentão reverente,
piedoso mesmo. No fundo do coração, porém, desejava uma oportunidade absolutamente legítima em que pudesse
salvar os inocentes destruindo os culpados.
- Chegou o dia! -
pensei comigo mesmo enquanto me levantava. Há pessoas correndo perigo e se eu
não fizer alguma coisa é bem possível que elas acabem se ferindo.
Quando me viu
levantando, o bêbado percebeu a chance de canalizar a sua ira.
- Ah! - rugiu ele.
Um estrangeiro! Você está precisando de uma lição em boas maneiras japonesas!
Eu estava de pé,
segurando de leve nas alças presas ao teto do vagão, e lancei-lhe um olhar de
nojo e desprezo. Pretendia acabar com a sua raça, mas precisava esperar que ele
me agredisse primeiro. Queria que ficasse com raiva, por isso curvei os lábios
e mandei-lhe um beijo insolente.
- Agora chega!
gritou ele. Você vai levar uma lição. E se preparou para me atacar.
Mas uma fração de
segundo antes que ele pudesse se mexer, alguém deu um berro:
- Ei!
Foi um grito
estridente, mas lembro-me que tinha um estranho timbre, jubiloso e cadenciado,
como quando estamos procurando alguma coisa junto com um amigo e ele
subitamente a encontra: "Ei!"
Virei para a
esquerda, o bêbado para a direita. Nós dois olhamos para um velhinho japonês
que estava sentado em um dos bancos. Esse minúsculo senhor devia ter bem mais
de setenta anos, e vestia um quimono impecável. Não me deu a menor atenção, mas
sorriu com alegria para o operário, como se tivesse um importantíssimo e
delicioso segredo para lhe contar.
- Venha aqui disse
o velhinho num tom coloquial e amistoso. Vem aqui conversar comigo insistiu,
chamando-o com um aceno de mão.
O homenzarrão
obedeceu, mas postou os pés beligerantemente diante dele e gritou por cima do
barulho das rodas nos trilhos:
- Por que diabos vou
conversar com você?
Ele agora estava de
costas para mim. Se o seu cotovelo se movesse um milímetro que fosse eu o
esmagaria. Mas o velhinho continuou sorrindo para o operário.
- O que você andou
bebendo? perguntou com os olhos brilhando de interesse.
- Saquê! rosnou de
volta o operário e não é da sua conta! completou, lançando perdigotos no
rosto do velho.
- Que ótimo
retrucou o velho. Excelente mesmo. Eu também adoro saquê! Todas as noites, eu
e minha esposa aquecemos uma garrafinha de saquê e vamos até o jardim nos
sentar num velho banco de madeira. Ficamos olhando o pôr-do-sol e vendo como
vai indo o nosso caquizeiro. Foi meu bisavô quem plantou essa árvore, e
estávamos preocupados achando que ela não fosse se recuperar das tempestades de
gelo do último inverno. Mas a nossa arvorezinha saiu-se melhor do que esperávamos,
ainda mais se considerarmos a má qualidade do solo. É gratificante olhar para
ela quando levamos uma garrafinha de saquê para apreciar o final da tarde,
mesmo quando chove!
E olhava para o
operário, seus olhos reluzentes. O rosto do operário, que se esforçava para
acompanhar a conversa do velhinho, foi se abrandando e seus punhos pouco a
pouco relaxando.
- É, é bom. Eu também
gosto de caqui... mas sua voz acabou num sumiço.
- São deliciosos
concordou o velho sorrindo. E tenho certeza de que você também tem uma ótima
esposa.
- Não retrucou o
operário. Minha esposa morreu.
Suavemente,
acompanhando o balanço do trem, aquele homenzarrão começou a chorar.
- Eu não tenho
esposa, eu não tenho casa, eu não tenho emprego. Eu só tenho vergonha de mim
mesmo.
Lágrimas escorriam
pelo seu rosto; um frêmito de desespero percorreu-lhe o corpo.
Chegara a minha vez.
Lá estava eu, com toda a minha imaculada inocência juvenil, com toda a minha
vontade de tornar o mundo um lugar melhor para se viver, sentindo-me de repente
mais sujo do que ele.
O trem chegou à minha
estação. Enquanto as portas se abriam, ouvi o velho dizer solidariamente:
- Minha nossa, que
desgraça. Sente-se aqui comigo e me diga o que houve.
Voltei-me para dar
uma última olhada. O operário escarrapachara-se no banco, a cabeça no colo do
velhinho, que afagava com ternura seus cabelos emaranhados e sebosos.
Enquanto o trem se
afastava, sentei-me num banco da estação. O que eu pretendera resolver pela
força fora alcançado com algumas palavras meigas. Eu acabara de presenciar o
Aikido num combate de verdade, e a sua essência era o Amor. A partir de agora
teria que praticar a arte com um espírito totalmente diferente. Muito tempo
passaria antes que eu voltasse a falar sobre a resolução de conflitos.”
*Terry Dobson, o autor e protagonista desta
história, foi um o primeiro americano a treinar com O fundador do Aikido,
Morihei Ueshiba e um dos poucos ocidentais que foram uchi-deshi e aluno direto
dele.
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